O debate sobre diversidade avançou, mas a presença de pessoas LGBTQIA+ em cargos de liderança continua restrita. Mesmo em empresas com iniciativas afirmativas, são poucos os que alcançam as posições de decisão.
Dados da Gestão Kairós mostram isso com clareza. Apenas 4,1% das liderança, do nível de gerência para cima, são ocupadas por profissionais LGBTQIA+.
Além disso, 33% dos relatos de discriminação ou preconceito no ambiente de trabalho estão ligados à diversidade sexual — seja por orientação afetivo-sexual ou identidade de gênero.
Esses números revelam o que, no fundo, todo mundo sabe: o caminho até a liderança segue desigual.
E isso não acontece por falta de competência ou ambição, mas por estruturas que não favorecem o desenvolvimento e a promoção de lideranças diversas.
“Um dos principais obstáculos, de fato, é o preconceito. Conceitos socialmente construídos em relação a pessoas LGBTQIA+ muitas vezes atrapalham um processo seletivo, impactam na sensação de pertencimento dentro das empresas e destroem a segurança psicológica para se ser quem é dentro do trabalho.” A fala é de Gabriel Romão, especialista em comunicação, diversidade e inclusão.
Desenvolver é preparar o caminho
Desenvolver lideranças LGBTQIA+ vai além de contratar. É preciso criar condições reais para que esses profissionais cresçam, se fortaleçam e ocupem posições estratégicas.
Isso significa, antes de tudo, reconhecer as barreiras que ainda existem no ambiente corporativo.
Uma delas é a ausência de segurança psicológica, que impacta não só a permanência, mas também a performance dessas pessoas.
“Como você executa um bom trabalho tendo que esconder quem é ou ouvindo piadas enquanto trabalha? Como você se sente pertencente em um lugar onde não pode usar o banheiro conforme sua identidade de gênero?”, provoca Gabriel.
Esse tipo de situação vai minando a confiança, o desempenho e as esperanças desses trabalhadores de alcançar cargos mais altos.
E ações concentradas em datas comemorativas, como o mês do orgulho, apesar de contribuírem com a luta, não são suficientes. “Letramento é parte da estratégia. Ações de celebração são parte da estratégia. Mas não são toda a estratégia”, reforça o especialista.
Sem continuidade e intenção, a diversidade não se traduz em presença real.
Para mudar esse cenário, Gabriel defende que o desenvolvimento precisa ser planejado com base nas vivências e desafios específicos que pessoas LGBTQIA+ enfrentam.
“Uma das principais formas de se construir programas de desenvolvimento que levam em conta a vivência de pessoas da LGBTQIA+ é ouvir. Levar em consideração as bagagens dos profissionais gera programas realmente inclusivos e faz com que os participantes aprendam mais”, explica Gabriel.
Por onde começar: cinco ações para desenvolver lideranças LGBTQIA+
Se a sua empresa ainda não tem uma estratégia estruturada para impulsionar lideranças LGBTQIA+, estas ações podem ser o ponto de partida:
- Capacite líderes e mentores para o acolhimento consciente
Promova formações sobre vieses, escuta ativa, interseccionalidade e segurança psicológica. O desenvolvimento de lideranças diversas depende de quem já está no topo abrir espaço com responsabilidade. - Implemente programas de mentoria com foco em diversidade
Estruture mentorias com uma curadoria criteriosa de mentores, escuta ativa e alinhamento com os desafios específicos das pessoas LGBTQIA+. Use a mentoria como ponte entre o talento e as oportunidades reais. - Crie metas, indicadores e formas de acompanhamento
Estabeleça indicadores para medir a evolução. Gabriel reforça: “o plano de desenvolvimento e sucessão de talentos deve contemplar pessoas LGBTQIA+. Precisamos ter metas atreladas a esse processo para ter mais representatividade” - Garanta continuidade e apoio da alta liderança
Evite que as ações dependam apenas de uma área ou gestor. Inclua o desenvolvimento de lideranças de grupos minorizados na estratégia e assegure recursos, patrocínio e permanência.
Mentoria: ponte para oportunidades
Os programas de mentoria são uma das ferramentas mais eficazes para acelerar o desenvolvimento de lideranças diversas.
“A mentoria cria um espaço de confiança onde é possível trocar conhecimentos, ampliar repertórios e desenvolver habilidades com o apoio de alguém mais experiente e que não está ali para julgar.”
Além de apoiar o desenvolvimento de competências que ampliam as oportunidades dentro e fora da empresa, Gabriel destaca outro ponto importante: muitas pessoas LGBTQIA+ se sentem isoladas no ambiente de trabalho. A mentoria, segundo ele, pode ajudar a mudar esse cenário, fortalecendo o senso de pertencimento.
Mas para que funcione de verdade, o programa de mentoria precisa ser construído com intencionalidade. Isso significa preparar os mentores, estabelecer objetivos claros e acompanhar o impacto do programa ao longo do tempo.
Promover lideranças diversas não é uma decisão para o futuro. Essa é uma escolha que empresas que querem ampliar sua capacidade de inovação, elevar a produtividade, respeitar seus colaboradores e cumprir sua função social precisam fazer hoje.
A diversidade deve sair dos discursos e entrar nos planos. Vamos começar agora?