O que acontece quando alguém não se sente seguro no lugar onde trabalha?
Primeiro, essa pessoa começa a medir cada palavra. Evita dar opiniões, deixa dúvidas de lado e esconde fragilidades.
A energia passa a ser gasta controlando o que dizer. O foco deixa de ser a qualidade do trabalho e vira autoproteção.
Com o tempo, o profissional aprende que é mais seguro calar do que arriscar, que é melhor entregar o mínimo do que tentar algo novo e que, se cometer um erro, o melhor é esconder.
O medo de expressar ideias e opiniões inibe a inovação e a criatividade. O receio de ser julgado reduz a participação e o engajamento. A pressão constante aumenta o estresse e a ansiedade, afetando a saúde mental e gerando fadiga.
A performance cai não por falta de capacidade, mas porque o ambiente não permite que o potencial apareça.
Essa mudança de comportamento, na prática, é um processo de perda coletiva: de energia, de engajamento, de inovação e de resultados.
Vamos falar de segurança psicológica?
“Quando falamos em segurança psicológica, estamos falando da dinâmica das relações, da qualidade das interações e de como criamos espaços de diálogo para fomentar um ambiente onde todos se sintam confortáveis com suas próprias identidades e possam expressar suas ideias, opiniões e dúvidas sem medo de críticas, julgamentos ou retaliações”, afirma Alessandra Cavalcante, mentora Top2You, C-Level de RH e cofundadora da GoHuman, consultoria especializada em desenvolvimento organizacional.
O termo foi definido pela professora Amy Edmondson, da Harvard Business School, em pesquisas realizadas nos anos 1990, quando ela identificou que equipes de alto desempenho não eram as que cometiam menos erros, mas as que se sentiam seguras para reconhecê-los e aprender com eles.
No dia a dia, segurança psicológica significa poder discordar do gestor sem receio de retaliação, admitir uma dúvida sem medo de parecer incompetente ou sugerir uma ideia sem se preocupar em ser ridicularizado.
“Essa sensação cria um ciclo positivo de comunicação aberta, confiança e colaboração, que impulsiona o aprendizado, a performance e o desenvolvimento individual e coletivo”, explica Alessandra.
Do ponto de vista organizacional, a mentora conta que os ambientes psicologicamente seguros contribuem para melhorar o desempenho das equipes, pois a colaboração verdadeira e a comunicação são facilitadas; reter talentos, já que pessoas tendem a permanecer onde se sentem valorizadas e seguras para contribuir; inovação acelerada e resolução eficaz de problemas, pois as equipes se sentem confortáveis para levantar desafios sem medo e, por fim, para redução de conflitos e aumento da coesão do time.
Para isso, porém, os empregadores precisam fazer a parte deles. “As empresas devem garantir que sistemas, processos e políticas sejam claros e promovam respeito, diversidade, equidade e práticas que contribuam para um ambiente psicologicamente seguro. Também é papel delas monitorar e identificar pontos críticos, respondendo com ações”, detalha.
O papel da liderança
Alessandra ainda defende que são as organizações que devem capacitar lideranças e equipes para que elas cultivem, dia após dia, um ambiente onde a segurança impere.
“Líderes têm um papel fundamental na construção de culturas de segurança psicológica, pois moldam cultura e calibram as relações, estabelecendo acordos e buscando o equilíbrio entre respeito e permissão”, diz a especialista.
Quando lideranças reconhecem erros e incentivam a livre expressão de opiniões, por exemplo, fomentam confiança e estimulam a abertura. Quando incluem e valorizam diferentes pontos de vista, facilitam a colaboração e estimulam o trabalho em equipe.
A liderança que entende o peso de suas ações transforma o ambiente de trabalho em um espaço onde as pessoas arriscam, inovam e entregam mais do que o esperado, porque sabem que suas opiniões têm lugar.
Entre os comportamentos que fazem a diferença, segundo Alessandra, estão:
1. Escutar de verdade: reforçar que todas as vozes importam, criando um espaço onde as pessoas se sintam pertencentes.
2. Estimular a curiosidade e o questionamento: incentivar perguntas, aprendizados contínuos e escuta ativa para perspectivas diversas.
3. Fomentar a colaboração genuína: garantir que as interações sejam de ajuda mútua e apoio, construindo relações com bases sólidas de confiança.
4. Desenvolver a coragem para agir: apoiar as pessoas para que tenham segurança para tomar iniciativas e enfrentar desafios.
A mentoria e a segurança psicológica
O líder de hoje não pode se limitar a bater metas ou controlar processos. Ele precisa ser capaz de criar ambientes onde as pessoas se sintam seguras para falar, discordar e se arriscar sem medo.
E, como toda competência essencial, ela pode — e deve — ser desenvolvida.
A mentoria é um caminho ágil e assertivo para isso.
Em um espaço protegido, diálogos verdadeiros acontecem e experiências são compartilhadas de forma prática.
Ao ouvir quem já enfrentou dilemas semelhantes, líderes encontram inspiração e ferramentas concretas para sustentar conversas difíceis, lidar com diferenças e construir confiança no dia a dia.
Essa vivência transforma a liderança de dentro para fora.
Líderes que passam pela mentoria se tornam mais preparados para cultivar ambientes seguros em suas equipes, fazendo da segurança psicológica não um ideal distante, mas uma prática incorporada à cultura de trabalho.
Trabalhar com medo tem um custo que nenhuma organização pode bancar. Trabalhar com segurança, ao contrário, abre espaço para inovação, crescimento e resultados sustentáveis.
A escolha está sempre na forma como lideramos.PS: Para mergulhar ainda mais no tema, indicamos este artigo da Alessandra Cavalcante, em que ela aprofunda a importância de personalizar a linguagem da segurança psicológica e como implementá-la de forma eficiente nas empresas.