Quebrar barreiras sempre fez parte do caminho de Patrícia Mirilli. Primeira mulher na mesa de operações da Shell Brasil (onde se negociam ativos no mercado financeiro), ela construiu uma carreira de liderança em gigantes como Claro, TIM, L’Oréal e Dasa, sempre guiada pela coragem de se posicionar e se reinventar.
Economista pela UFRJ, Patrícia começou sua carreira na Shell em 1991, como estagiária, e hoje é uma conselheira reconhecida no mercado que já integrou o Top 10 Executivos RH da 7th Experience, uma plataforma de conexão de líderes.
Mas isso só aconteceu com muito esforço, resiliência e a habilidade de enfrentar obstáculos. E, por ser mulher, não ter medo de se posicionar.
Embora tenha tido uma trajetória muito bem-sucedida na multinacional petrolífera, Patrícia lembra que, em meados da década de 90, o quadro de funcionários da Shell era majoritariamente masculino e que, para ser reconhecida, era necessário muito mais do que competência.
“Sou uma pessoa que fala rápido e fala alto porque, nas reuniões, precisava falar alto para ser ouvida e rápido para não ser cortada. Também usava sempre terninho azul-marinho ou cinza, sem maquiagem, sem jóias. Era uma maneira de não se destacar”, conta.
Hoje, ela reflete sobre o machismo da época, especialmente em ambientes historicamente ocupados por homens, mas torce que suas filhas, que estão prestes a entrar no mercado de trabalho, possam encontrar um cenário diferente.
“Talvez haja outros desafios, mas espero que não precisem mais se provar por serem mulheres. Espero de verdade que isso já tenha mudado.”
A jornada pelas telecomunicações e a coragem de optar pela família
Em 1999, Patrícia já era Analista Sênior de Tesouraria da Shell, mas queria experimentar um novo mercado. Por isso, pediu demissão para ingressar em uma startup de telefonia móvel que mais tarde seria incorporada pela Claro.
Em cerca de cinco anos, concluiu MBA em Marketing e passou pelas áreas de Planejamento de Marketing, Produto e Comercial.
“Foi também nessa fase que tive minha primeira filha. Quando a Claro decidiu transferir a matriz para São Paulo, percebi que, com uma bebê pequena, não era o momento de mudar de cidade. Então decidi buscar novas oportunidades no mercado.”
Foi assim que ela migrou para a TIM. Entrou como Gerente de Planejamento Estratégico e Qualidade Comercial em 2004 e chegou a Gerente Sênior de Planejamento Comercial, cinco anos depois.
Em 2009, também escolheu priorizar a família. Com duas filhas pequenas e um cargo que exigia que viajasse por todo o país, viu que o ritmo não era sustentável e decidiu deixar a TIM.
Da diretoria financeira à paixão por RH
O próximo capítulo da trajetória de Patrícia começou ainda em 2009, quando foi convidada para a diretoria financeira da L’Oréal Brasil.
Três anos depois, foi chamada para apoiar a área de Recursos Humanos, inicialmente para implementar processos e controles financeiros. Mas o que era para ser uma missão pontual se transformou em paixão. “Me apaixonei pela área. Não quis voltar para finanças e pedi para ficar no RH”, afirma.
A transição para a posição de Diretora de Remuneração, Benefícios e Serviços de RH foi cuidadosamente conduzida, mas trouxe inseguranças.
Em sua primeira reunião com o comitê de RH, a executiva perguntou se alguém gostaria de ocupar a cadeira que ela assumiu. A resposta veio com bom humor: os colegas disseram que aquela posição era cheia de desafios e que estavam felizes de ver ela chegar para resolver o problema.
Com frio na barriga, mas cheia de energia, Patrícia colocou as mãos na massa. “Propus fazer concorrências e trocar fornecedores para reduzir custos. Depois, revertemos tudo para programas que melhorassem a experiência dos colaboradores. Mas sempre com responsabilidade financeira. Nunca mexemos nos resultados do negócio.”
Pandemia: uma nova visão sobre a vida
No período mais crítico da pandemia, Patrícia atuou como representante do RH da L’Oréal no Comitê de Crise da Covid-19, participando das decisões sobre saúde física, mental e políticas emergenciais de proteção aos colaboradores.
Essas vivências, somadas a uma reflexão pessoal, a levaram a perceber que precisava de um tempo para si e para a família. Foi nesse momento que ela decidiu se desligar da multinacional.
“Muita gente começou a pedir demissão, entendendo que aquela situação estava afetando sua saúde mental. Eu fui uma dessas pessoas. Pedi para sair sem outro plano ou proposta. Eu queria, de fato, cuidar de mim, da minha família e da minha casa. Naquele momento, isso era o mais importante.”
Depois de seis meses em sabático, Patrícia foi contratada pela Dasa, rede de laboratórios, e ficou lá cerca de dois anos. Nesse período, liderou ações de competitividade salarial, coordenou a mudança para a nova sede e fortaleceu programas de saúde integral.
Deixou a companhia em 2023 e passou o ano seguinte como CEO do Grupo Conduzir, especializado no tratamento de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
O período foi enriquecedor pela oportunidade de ocupar a cadeira de CEO e pelo forte propósito do negócio: apoiar o desenvolvimento e a inclusão de pessoas neurodivergentes.
Essa experiência a marcou profundamente e consolidou sua crença de que, mais do que resultados financeiros, empresas devem existir para gerar valor social real.
Mentora e conselheira
Em busca de mais autonomia e equilíbrio, Patrícia se tornou conselheira de empresas e, em 2023, foi convidada para integrar a rede de mentores da Top2You.
Com a bagagem construída ao longo de sua carreira, ela sentiu que era uma forma de ajudar outros profissionais a superar dores e desafios que, em algum momento, também enfrentou.
A cada encontro, ela traz exemplos reais do que viveu e ajuda o mentorado a ter melhor perspectiva sobre suas forças, desafios e próximos passos.
Além das mentorias e da participação em conselhos de administração, Patrícia se dedica a projetos voluntários e está escrevendo um capítulo do livro Mulheres nas Finanças, a ser lançado em breve.
Ela encara este novo momento com entusiasmo: “Estou aberta a novos projetos e muito feliz com a leveza com que estou vivendo este momento. Ao contrário do que imaginei, o fim da vida corporativa tradicional não trouxe depressão. Estou cheia de energia e pronta para colaborar com a sociedade e o mercado na minha nova fase”, conclui.