De cada 100 pessoas pretas no Brasil, 84 relatam já ter sofrido discriminação racial.
O dado, revelado por uma pesquisa apoiada pelo Ministério da Igualdade Racial, mostra que o preconceito está no nosso dia a dia — nas ruas, nas escolas e, sim, nos ambientes de trabalho.
A desigualdade também se reflete no acesso a oportunidades de emprego: segundo levantamento do IBGE, em 2023, as pessoas pretas (8,9%) e pardas (8,5%) tinham taxa de desemprego superior à de pessoas brancas (5,9%).
São números que derrubam qualquer ilusão de que a questão racial já foi superada e mostram por que adotar uma postura antirracista é urgente.
E essa não é uma pauta exclusiva da sociedade civil ou do poder público, as empresas também têm uma responsabilidade social inegável na construção de um mundo mais justo.
“Ser antirracista é ir além de ‘não ser racista’: é agir ativamente para desconstruir estruturas, práticas e discursos que sustentam desigualdades. Envolve posicionamento, responsabilidade e ação contínua”, afirma Adriana Alves, executiva premiada, ex-diretora de Pessoas, Governança e Integridade no Pacto Global da ONU e mentora da Top2You. É esse o eixo central de seu novo livro, O Manual da Empresa Antirracista.
O custo-racismo e o mito do “aqui não existe preconceito”
Ao longo de uma trajetória de mais de 25 anos atuando com liderança, cultura organizacional, governança, relações institucionais e comunicação, Adriana consolidou o conceito de “custo-racismo”: o preço que empresas pagam por ignorar ou subaproveitar talentos negros.
Esse custo se traduz em inovações que nunca saíram do papel, equipes menos criativas, perda de produtividade e dificuldade de competir em mercados cada vez mais diversos e conscientes. Trata-se de um prejuízo silencioso, mas constante.
E a maioria das empresas sequer percebem que estão pagando essa conta, porque a ausência de diversidade se tornou norma.
Muitas lideranças se apóiam na crença de que “na minha empresa não existe racismo”. E, para Adriana, essa negação é parte do problema. “Muitas vezes, esses padrões são tão naturalizados que passam despercebidos”, aponta.
É que o racismo estrutural raramente se apresenta em atitudes explícitas. Ele se manifesta em decisões aparentemente neutras: quem é contratado e promovido, quem recebe projetos estratégicos, quais vozes são ouvidas nas reuniões ou como as oportunidades são distribuídas.
Reconhecer esses sinais é o primeiro passo de uma jornada que precisa ser intencional.
Como iniciar a jornada antirracista
Transformar realidades exige método, consistência e coragem para mexer em estruturas que privilegiam poucos e excluem muitos.
Segundo Adriana, a mudança começa pelo mapeamento honesto da realidade interna e por um compromisso genuíno da liderança. “Depois, vêm as ações estruturantes, como revisão de políticas, metas claras e acompanhamento de resultados. O livro nos oferece muitos exemplos com resultados positivos”, pontua Adriana.
Mas a autora alerta: implementar medidas isoladas, sem conexão com a estratégia do negócio, é desperdiçar recursos e credibilidade.
Companhias que, de fato, se tornam referência no combate ao racismo tratam diversidade e inclusão como eixos estratégicos, vinculados aos objetivos corporativos. “Elas têm líderes que se educam continuamente, que assumem riscos para promover mudanças e que mantêm coerência entre discurso e prática”, reforça.
O papel da liderança aqui é central. E não apenas no discurso.
Líderes preparados para promover inclusão entendem que não se trata de “fazer caridade”, mas de criar as condições para que todos possam contribuir e prosperar — algo que impacta diretamente o desempenho das pessoas e a sustentabilidade da organização.
Nesse sentido, O Manual da Empresa Antirracista não é apenas um livro. É um roteiro de ação para líderes que já perceberam que o tempo da neutralidade acabou. Ele oferece um caminho para quem quer sair do terreno das intenções e entrar no território transformador das mudanças estruturais.
Afinal, ou sua empresa rompe privilégios e abre espaço para todos agora, ou está escolhendo, diariamente, manter as injustiças.